As lagartixas são presenças frequentes em lares brasileiros e surgem, na maioria das vezes, de forma silenciosa e inesperada. Esses pequenos répteis são vistos com diferentes percepções: enquanto alguns moradores associam sua presença a limpeza ou desleixo, outros entendem que esses animais fazem parte do ecossistema urbano e cumprem uma função específica. A verdade, no entanto, é que a presença da lagartixa-de-parede dentro de casa está diretamente ligada a fatores ambientais, alimentares e biológicos.
Pontos Principais:
Hemidactylus mabouia, nome científico da espécie mais comum em ambientes domésticos no Brasil, é um animal exótico originário da África. Estudos indicam que ela chegou ao continente americano há séculos, possivelmente por meio de navios negreiros ou balsas naturais, e hoje é amplamente distribuída em áreas urbanas, principalmente em regiões de clima tropical. Seu comportamento noturno e sua capacidade de escalar paredes fazem com que seja facilmente vista em tetos, frestas e janelas à noite, principalmente em locais com iluminação artificial.
Apesar do desconforto causado em algumas pessoas, sua presença está relacionada a condições que favorecem a sobrevivência desses animais, como temperatura ambiente, disponibilidade de abrigo e, principalmente, oferta de alimento. Por se alimentarem de insetos, as lagartixas funcionam como predadoras naturais em espaços onde há grande quantidade de pragas domésticas, o que estabelece uma relação indireta entre a presença desses répteis e a presença de mosquitos, traças, aranhas e até escorpiões.
A Hemidactylus mabouia apresenta atividade principalmente noturna. Durante o dia, permanece escondida em locais escuros e de difícil acesso, como atrás de móveis, frestas nas paredes e forros. Ao anoitecer, sai em busca de alimento, priorizando regiões iluminadas, onde insetos são atraídos pela luz. Esse comportamento oportunista a transforma em uma espécie adaptável aos ambientes urbanos.
Sua locomoção é facilitada por estruturas nas patas conhecidas como lamelas adesivas, que contêm milhares de microestruturas capazes de aderir até mesmo a superfícies lisas como vidro. Essa aderência se dá por meio das forças de Van der Waals. Por esse motivo, é comum vê-las em paredes verticais e tetos, explorando locais onde o alimento é mais facilmente capturado.
Em situação de risco, esse animal possui um mecanismo de defesa conhecido como autotomia caudal. Quando se sente ameaçada, a lagartixa pode soltar parte de sua cauda, que continua se movimentando por alguns instantes mesmo após a separação, distraindo o possível predador. A regeneração ocorre posteriormente, porém a nova cauda apresenta diferenças morfológicas, como ausência de vértebras e textura distinta.
No contexto doméstico, a lagartixa não representa perigo direto para os seres humanos. Não possui veneno, não morde e não transmite doenças conhecidas para pessoas. Por outro lado, seu impacto pode ser relevante em casas com animais domésticos, principalmente gatos. Existe um risco específico associado à ingestão acidental da lagartixa por felinos: a platinosomose.
Essa doença é causada por um parasita hepático chamado Platynosomum fastosum, que pode se alojar nas vias biliares dos gatos. A infecção pode levar à inflamação do fígado e, em casos avançados, causar obstruções e falência hepática. Os sintomas incluem vômito, icterícia, perda de peso e apatia. A evolução da doença pode ser silenciosa, o que dificulta o diagnóstico precoce. Cães, embora não sejam afetados por essa doença específica, podem apresentar reações gastrointestinais ao ingerirem lagartixas, como vômito e diarreia.
O contato humano com esses animais é evitado naturalmente por elas. São tímidas e se afastam diante de movimentações bruscas. Eventualmente, em situações de captura ou susto, podem soltar a cauda, o que exige cuidado na manipulação caso seja necessário removê-las manualmente do ambiente.
A reprodução da lagartixa-de-parede ocorre ao longo de todo o ano, com maior frequência durante os períodos mais úmidos. Trata-se de uma espécie com reprodução poliginândrica, o que significa que diversos machos podem acasalar com diversas fêmeas em uma mesma população. A fertilização é interna e ocorre após o macho introduzir seu hemipênis na cloaca da fêmea.
A fêmea deposita entre um e dois ovos por ninhada, geralmente em frestas ou locais protegidos. Os ovos têm cerca de 1 cm de diâmetro, casca calcária e aparência esbranquiçada. A incubação pode durar de 56 a 77 dias. É possível visualizar os ovos no ventre da fêmea, pois sua pele ventral é translúcida. Após o nascimento, os filhotes pesam entre 0,2 e 0,35 gramas e atingem a maturidade sexual entre 6 e 12 meses, de acordo com o tamanho corporal.
Não há diferença significativa no padrão de coloração entre os sexos, mas os machos tendem a ter cabeças maiores e mais robustas, com mandíbulas proeminentes. Essa característica pode estar relacionada à disputa por território e acasalamento. Além disso, machos possuem mais poros femorais, utilizados na liberação de feromônios.
Apesar de ser uma espécie exótica, a lagartixa-de-parede tem papel funcional no controle biológico de pragas. Em regiões urbanas, predam escorpiões, baratas, aranhas e mosquitos transmissores de doenças. Sua presença é um indicativo indireto da existência de uma cadeia alimentar ativa em ambientes urbanos.
Entretanto, como espécie introduzida, a Hemidactylus mabouia pode competir com espécies nativas de lagartos e até causar sua diminuição, como já observado em algumas regiões da América do Norte. Estudos ainda estão em andamento para entender os impactos ecológicos de longo prazo da proliferação dessa espécie em diferentes habitats.
Para quem deseja limitar sua presença sem eliminar o animal, o ideal é modificar as condições ambientais da residência. Isso inclui reduzir a população de insetos, diminuir a iluminação externa à noite, vedar frestas e eliminar pontos de umidade. Produtos repelentes com baixa toxicidade e seguros para animais de estimação também são opções viáveis.
Com tamanho médio entre 6 e 7 cm do focinho à cloaca e peso em torno de 5 g, a lagartixa-de-parede apresenta corpo robusto, pele úmida e sem escamas visíveis. A coloração vai do branco acinzentado ao marrom claro, podendo apresentar listras em forma de “V” e faixas na cauda. Essas características podem variar com a iluminação e temperatura do ambiente.
O coração possui dois átrios e um ventrículo parcialmente dividido, o que permite a mistura de sangue oxigenado e desoxigenado, padrão comum entre répteis. Seus olhos não possuem pálpebras, sendo protegidos por uma membrana que é hidratada com a própria língua. Isso está relacionado à sua adaptação noturna e à alta sensibilidade óptica.
O trato digestivo é simples, adequado a uma dieta à base de insetos. A espécie é capaz de alterar sua coloração por meio de cromatóforos, o que ajuda na camuflagem e controle térmico. Durante interações sociais, especialmente entre machos, é comum observar emissão de sons, movimentação da cauda e até confrontos físicos para estabelecer domínio territorial.
Fonte: Oantagonista, Uol, Wikipedia e Estadao.