A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal atingiu nesta quinta-feira um marco decisivo ao consolidar maioria para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus. O julgamento envolve acusações de participação em um plano de golpe contra o resultado das eleições de 2022, num processo que expõe as tensões institucionais acumuladas desde aquele pleito.
O voto da ministra Cármen Lúcia foi determinante para formar maioria, restando apenas a manifestação de Cristiano Zanin, que já não pode alterar o resultado final. A magistrada seguiu integralmente o relatório de Alexandre de Moraes e reforçou a tese de que Bolsonaro atuou não como coadjuvante, mas como articulador central da empreitada. Para ela, houve provas consistentes de um esforço organizado para minar a democracia.
Entre os réus, figuram nomes de peso da cúpula do governo Bolsonaro, como os ex-ministros Augusto Heleno, Anderson Torres e Paulo Sérgio Nogueira, além do ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem, e do almirante Almir Garnier. Também estão no rol Mauro Cid, ex-ajudante de ordens, e o general Walter Braga Netto, que disputou a vice-presidência em 2022.
Os magistrados analisam cinco crimes denunciados pela Procuradoria-Geral da República: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A imputação não é uniforme a todos, já que Ramagem, por exemplo, não responde pelos crimes relacionados aos ataques de 8 de janeiro de 2023.
Cármen Lúcia destacou que a Procuradoria reuniu elementos que demonstram a existência de uma milícia digital destinada a atacar instituições, em especial a Justiça Eleitoral e o sistema de votação. Na avaliação dela, Bolsonaro foi “o causador” dos atos, em vez de ter sido arrastado por seus aliados. Essa visão sustenta a responsabilização direta do ex-presidente como líder de uma organização criminosa.
O voto também diferenciou os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado, rejeitando a tese de absorção defendida por Luiz Fux, que havia absolvido alguns réus. Para a ministra, as condutas devem ser analisadas separadamente, o que amplia o alcance das condenações e reforça a gravidade do caso.
No caso de Mauro Cid, a ministra apontou participação efetiva que ia além da questão das urnas, incluindo envolvimento ativo em atos criminosos. Já sobre Braga Netto, a maioria se formou em 4 a 0 para condená-lo pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O placar geral reforça uma leitura de que a cúpula do governo não apenas tolerou, mas incentivou práticas voltadas à ruptura institucional.