A criação do Programa Escola em Tempo Integral representa um marco na política nacional para expandir o ensino em tempo integral, de acordo com especialistas consultados pela Agência Brasil. A lei que institui o programa será em breve sancionada.
A nova legislação estabelece diretrizes para o repasse de recursos e assistência técnica da União para estados, Distrito Federal e municípios, com o objetivo de aumentar o número de vagas na modalidade de ensino em tempo integral, que requer uma jornada igual ou superior a 7 horas diárias, ou 35 horas semanais. Segundo o Ministério da Educação (MEC), será investido um montante de R$ 4 bilhões no programa, com a meta de criar 3,6 milhões de novas vagas até o ano de 2026, sendo 1 milhão delas já na primeira etapa.
A diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz, Natacha Costa, enfatiza que essa lei marca a retomada de uma agenda nacional para as escolas em tempo integral, uma vez que o programa sofreu reduções durante o governo de Michel Temer.
“Temer transformou o Programa Mais Educação no Programa Novo Mais Educação, este com foco apenas em reforço escolar. Então, houve um reducionismo da concepção do programa. Além disso, o investimento caiu drasticamente. O Programa Mais Educação foi reduzido e depois descontinuado. Bolsonaro extinguiu o programa”, destacou a especialista da organização que, há mais de 25 anos, atua na área da educação no Brasil.
Natacha acrescentou que a política de escolas em tempo integral ganhou destaque nacional em 2007, com a criação do Programa Mais Educação, e o Plano Nacional de Educação (PNE), em 2014, estabeleceu a meta de que 50% das escolas do país oferecessem ensino em tempo integral, com 25% dos alunos matriculados nessa modalidade até o final de 2024.
No entanto, entre 2015 e 2021, o percentual de alunos de escolas públicas em tempo integral caiu de 18,7% para 15,1% do total de matrículas, de acordo com levantamento da Campanha Nacional pelo Direito à Educação baseado em dados do Censo Escolar do MEC. O Brasil está, portanto, a 10 pontos percentuais de atingir a meta do PNE.
A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) afirma que a política nacional de escolas em tempo integral sofreu nos últimos anos devido à falta de investimentos.
“Nesse período, a falta de investimentos e de um olhar para essa questão fez com que ou se paralisasse ou se caminhasse a passos muito curtos. Você também não teve um olhar para o financiamento de outras políticas, como da alimentação escolar e da reorganização do transporte. Isso gerou uma falta de estímulo e até um efeito paralisia porque os municípios e estados não tiveram recursos para arcar com todo esse custo”, destacou o presidente da Undime, Luiz Miguel Garcia, que também é dirigente municipal de educação do município de Sud Mennucci (SP).
Garcia enfatizou que a criação do Programa Escola em Tempo Integral é importante, mas é fundamental que haja um ajuste no financiamento.
“Esse é o elemento central. Nós temos aí todo um processo de capacitação, de estruturação de equipe, de pessoal e de proposta pedagógica. Mas tudo isso passa pela garantia do financiamento. Sem essa garantia, a gente não consegue avançar em nenhum desses outros pontos.”
Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), avalia que os recursos já anunciados para a política de escola em tempo integral podem não ser suficientes.
“Se o Tribunal de Contas da União (TCU) fiscalizou e encontrou que mais da metade das escolas são inapropriadas, R$ 4 bilhões nos quatro anos do programa são suficientes para recuperar essas escolas?”, questionou o presidente do CNTE, para quem é preciso recuperar as escolas que existem e criar novas para o tempo integral.
Heleno referiu-se à fiscalização do TCU que concluiu que 57% das escolas públicas não são adequadas para esse tipo de ensino.
Ele também ponderou que a nova legislação é importante e necessária, mas que falta uma base normativa mais sólida para sustentar programas como esse, que acabam ficando dependentes do governo de plantão. Ele citou a ausência de uma lei para o sistema nacional de educação, que deveria articular as questões financeiras e técnicas entre os entes federados, além da falta de leis locais para a gestão democrática da educação brasileira.
*Com informações da Agência Brasil.