A bordo da nave New Shepard, em um voo suborbital da Blue Origin realizado no dia 14 de abril, sementes brasileiras de batata-doce e grão-de-bico foram enviadas ao espaço como parte de um experimento conduzido por cientistas ligados à Rede Space Farming Brazil. A missão teve como uma de suas integrantes a cantora norte-americana Katy Perry, acompanhada de uma tripulação exclusivamente feminina, incluindo a engenheira aeroespacial Aisha Bowe, ex-integrante da Nasa. O voo durou cerca de dez minutos e ultrapassou a Linha de Kárman, limite que marca o início do espaço, embora sem escapar totalmente da gravidade terrestre.
Pontos Principais:
O estudo brasileiro tem como objetivo observar os efeitos da microgravidade no desenvolvimento de vegetais. A ausência de gravidade representa uma condição de estresse intenso para as plantas, que deixam de reconhecer a direção natural do solo, o que afeta o crescimento das raízes e a ativação de seus genes. A iniciativa é parte de um esforço conjunto da Embrapa, da Agência Espacial Brasileira (AEB) e de outras instituições científicas que integram a Space Farming Brazil. Esse consórcio busca desenvolver variedades agrícolas adaptadas a ambientes extremos, tanto fora quanto dentro do planeta.

Os alimentos foram transportados até o Texas, nos Estados Unidos, local de onde partiu o foguete da Blue Origin. Antes do lançamento, pesquisadores brasileiros realizaram procedimentos para garantir a integridade genética das amostras. Ao retornarem, as plantas foram submetidas a uma solução química que preserva o seu estado pós-voo, permitindo uma comparação direta com clones idênticos cultivados simultaneamente na Terra. O resultado poderá oferecer novos caminhos para cultivos resilientes diante das mudanças climáticas.
A escolha da batata-doce e do grão-de-bico não foi casual. Essas espécies foram selecionadas por apresentarem ciclos de crescimento rápidos, boa adaptação a diferentes ambientes e aproveitamento integral. A batata-doce, por exemplo, tem folhas e raízes comestíveis. O grão-de-bico, por sua vez, é uma leguminosa rica em proteínas, com alto potencial para dietas balanceadas em ambientes isolados como estações espaciais.
O estudo procura entender como os genes das plantas reagem à microgravidade e a possíveis alterações metabólicas. Uma pesquisa anterior, publicada em 2024, mostrou que o mesmo ambiente pode provocar alterações significativas em até seis genes da Arabidopsis thaliana, planta da mesma família da mostarda. A expectativa dos pesquisadores brasileiros é identificar reações similares nas espécies alimentares enviadas agora ao espaço.
Mesmo sem a necessidade de viagens espaciais frequentes, os cientistas contam com estruturas em solo capazes de simular as condições ambientais fora da Terra. Equipamentos reproduzem tanto a ausência de gravidade quanto a radiação cósmica, acelerando as observações e permitindo ajustes em laboratório para futuras missões.

A participação do Brasil nesta missão só foi possível após o convite da Winston-Salem State University, dos Estados Unidos. A cooperação internacional é uma das frentes da Space Farming Brazil, iniciativa ligada ao programa Artemis, da Nasa. Desde 2023, o Brasil passou a contribuir com o programa por meio de pesquisas voltadas à produção de alimentos em ambientes de baixa gravidade, radiação intensa e ausência de solo.
Ao todo, 56 pesquisadores de 22 instituições nacionais participam da rede. O foco é o desenvolvimento de técnicas agrícolas aplicáveis não apenas em futuras colônias fora da Terra, mas também em locais da Terra afetados por degradação ambiental e escassez de recursos naturais. O desenvolvimento de sementes mais resistentes também pode auxiliar no combate à insegurança alimentar.
As amostras cultivadas em solo brasileiro e as que retornaram da viagem espacial serão analisadas geneticamente para avaliar alterações provocadas pelo estresse da microgravidade. Esse processo permitirá entender como adaptar vegetais às condições fora do planeta e criar estratégias de cultivo mais eficientes também em solo terrestre.
O voo da New Shepard foi realizado a partir de uma base no estado do Texas e contou com seis mulheres a bordo, entre elas a jornalista Lauren Sánchez, noiva de Jeff Bezos, fundador da Amazon e dono da Blue Origin. A missão foi transmitida ao vivo e marcou o primeiro voo com tripulação exclusivamente feminina desde a Vostok 6, em 1963. O voo foi suborbital e não escapou completamente da gravidade da Terra, mas superou a marca dos 100 km de altitude reconhecida como espaço.
A empresa Blue Origin iniciou suas operações de turismo espacial em 2021. Desde então, tem promovido viagens curtas com celebridades, turistas e pesquisadores a bordo, contribuindo para a popularização do acesso ao espaço e servindo como plataforma de testes para diversas experiências científicas.
A breve exposição das sementes às condições espaciais é suficiente para provocar reações importantes, como mudanças genéticas e alterações em processos biológicos fundamentais. O retorno em segurança do foguete e da cápsula permite que esses experimentos avancem com o respaldo técnico necessário para sua validação científica.
A iniciativa brasileira reforça a importância da ciência aplicada ao desenvolvimento agrícola em novos contextos, como missões de longa duração no espaço. O domínio de tecnologias para produção de alimentos fora da Terra é um dos pilares para o futuro da exploração espacial humana.
Além disso, as descobertas podem beneficiar diretamente comunidades terrestres que enfrentam desafios ambientais, como escassez hídrica ou solos improdutivos. O aprimoramento de cultivares com maior tolerância ao estresse pode representar um avanço significativo na segurança alimentar global.
O retorno das amostras ao Brasil, ainda pendente, dará início à etapa final do estudo, com análises laboratoriais e publicação dos dados. A expectativa é que, nos próximos anos, novas missões incluam outras espécies e colaborem com um banco genético adaptado às condições espaciais.
Fonte: Agenciagov, G1 e R7.
