A revelação de um esquema de descontos não autorizados sobre os benefícios de milhões de aposentados reacendeu o debate sobre os mecanismos de fiscalização do INSS. A operação, que envolveu a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU), expôs um cenário de possíveis desvios que vinham ocorrendo de forma sistemática desde 2019. O caso levou à suspensão imediata de repasses às entidades envolvidas e à promessa de devolução dos valores cobrados indevidamente.
Pontos Principais:
O governo anunciou a suspensão total de descontos realizados por sindicatos e associações diretamente na folha de pagamento dos segurados. A decisão, segundo autoridades do INSS, busca garantir a segurança dos aposentados e pensionistas enquanto se apura a real extensão das cobranças irregulares. O plano de ressarcimento será definido após a conclusão do levantamento dos valores desviados, estimados até o momento em até R$ 6,3 bilhões.
As entidades envolvidas, segundo a CGU, serão submetidas a uma revisão completa dos acordos de cooperação técnica com o INSS. A expectativa é reorganizar todo o sistema de autorizações de desconto em folha, garantindo que apenas os segurados que manifestarem consentimento expresso e documentado sejam vinculados a esse tipo de cobrança.

A medida do governo prevê a suspensão de todos os descontos já a partir dos contracheques emitidos em maio. A diretora de Orçamentos e Finanças do INSS, Débora Floriano, afirmou que não há necessidade de os beneficiários se deslocarem até as agências para impedir novos descontos. Todo o processo será conduzido administrativamente.
Além da interrupção, o INSS informou que as parcelas que eventualmente já tenham sido lançadas não serão repassadas às entidades. Em vez disso, serão devolvidas aos segurados já no mês seguinte, como parte da primeira etapa do plano de ressarcimento.
Segundo os dados obtidos nas investigações, aproximadamente 6 milhões de aposentados e pensionistas apresentavam, até o momento, algum tipo de desconto vinculado a associações. O governo ainda apura quantos desses descontos foram feitos sem autorização. Ao todo, o Brasil possui cerca de 40 milhões de beneficiários ativos.
O relatório da CGU indicou que o volume de descontos registrados teve um aumento significativo nos últimos anos. Em 2016, as cobranças somaram R$ 413 milhões. Em 2023, esse número saltou para mais de R$ 1,3 bilhão. A escalada começou em 2019 e coincidiu com mudanças na gestão dos acordos com entidades.
A investigação derrubou o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, substituído ainda sem anúncio oficial de um novo titular. A operação deflagrada teve como alvos pelo menos 11 entidades que estariam envolvidas em práticas fraudulentas. Foram cumpridos mandados de prisão e busca e apreensão em diversos estados.
Itens de alto valor foram apreendidos nas diligências, incluindo carros de luxo, relógios importados e obras de arte. Segundo a PF, o patrimônio apreendido está relacionado aos desvios dos valores dos beneficiários.
Entre as entidades investigadas está o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), que conta com a presença de José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do presidente Lula, em sua diretoria. Ele ocupa a vice-presidência e exerce papel político na instituição desde o ano passado.
Segundo o atual presidente da entidade, Milton Cavalo, todos os procedimentos de filiação seguem critérios rigorosos, como preenchimento de ficha com documentos, gravação de voz e imagens. Ele negou qualquer comunicação oficial por parte das autoridades até o momento.
Apesar das negativas, a inclusão do Sindnapi na lista de investigados reacendeu a tensão entre governo e oposição. Parlamentares oposicionistas usam o episódio para reforçar críticas sobre transparência e controle em entidades ligadas ao poder público, ainda que não haja, até agora, comprovação de participação direta de integrantes do governo.
O episódio evidenciou falhas nos sistemas de controle interno do INSS e expôs a vulnerabilidade dos aposentados a esquemas que operam sob a aparência de legalidade. A CGU agora trabalha na reestruturação dos convênios e na definição de novas regras para a retomada dos descontos autorizados.
A promessa do governo é que qualquer futura cobrança só seja permitida após análise rigorosa e com consentimento claro por parte dos beneficiários. O objetivo central é restabelecer a confiança e impedir que situações semelhantes voltem a ocorrer.
A apuração seguirá nos próximos meses e a lista completa das entidades investigadas será disponibilizada assim que a análise de documentos e contratos for finalizada pelas autoridades.
