Nas últimas semanas, escavações conduzidas por arqueólogos na cidade de Jerusalém voltaram a concentrar a atenção de estudiosos e religiosos de diversas partes do mundo. Um grupo internacional liderado pela arqueóloga italiana Francesca Romana Stasolla realizou novas investigações na Igreja do Santo Sepulcro, estrutura considerada há séculos como o possível local de crucificação, sepultamento e ressurreição de Jesus Cristo. A recente escavação revelou evidências que reacenderam o debate sobre a localização exata do túmulo descrito nos evangelhos.
Pontos Principais:
As escavações foram autorizadas como parte de uma renovação histórica da igreja, um esforço conjunto das três comunidades religiosas que administram o espaço: Ortodoxa, Franciscana e Armênia. Embora os trabalhos tenham sido temporariamente interrompidos devido ao período da Páscoa, o avanço obtido até o momento foi suficiente para que os pesquisadores divulgassem os primeiros achados. Entre os materiais identificados, há estruturas subterrâneas, fragmentos de cerâmica, moedas antigas, ossos de animais e resíduos de alimentos consumidos por peregrinos ao longo dos séculos.
O ponto central da descoberta é uma base circular de mármore encontrada sob o atual edículo, uma pequena construção que marca o suposto túmulo de Jesus. Essa estrutura remonta à época do imperador Constantino, no século IV, período em que foi promovida a primeira monumentalização cristã do local. A composição e disposição dos elementos arqueológicos reforçam a importância do sítio, mesmo que não ofereçam comprovação definitiva sobre a identidade da figura histórica sepultada ali.
O local onde as escavações estão sendo realizadas já era tradicionalmente reconhecido por diversas correntes do cristianismo como o possível túmulo de Jesus, mas a nova etapa do trabalho revelou informações que alinham relatos bíblicos a dados geológicos e botânicos. De acordo com o relato no Evangelho de João, o sepultamento ocorreu em um jardim próximo ao local da crucificação. Os vestígios botânicos identificados no solo — incluindo pólen de oliveiras e indícios de vinhedos — são compatíveis com o cenário descrito nas escrituras.
Além dos elementos vegetais, a equipe identificou vestígios de ocupação agrícola anterior à construção da igreja. Isso indica que a área servia como campo cultivado entre o Calvário e o túmulo, correspondendo aos registros narrativos antigos. Fragmentos de cerâmica e restos orgânicos encontrados no entorno fornecem pistas sobre o comportamento dos visitantes religiosos ao longo dos séculos, incluindo seus hábitos alimentares e práticas litúrgicas.
As moedas descobertas datam da mesma época em que Constantino ordenou a construção da basílica original. Esses objetos ajudam a datar com maior precisão a primeira intervenção cristã organizada no local e contribuem para a contextualização histórica da monumentalização da área. Os achados estão sendo catalogados e serão analisados por diferentes grupos de especialistas em arqueologia bíblica, numismática e antropologia.
A equipe liderada por Stasolla atua em turnos de 10 a 12 pessoas, com profissionais de diferentes áreas do conhecimento. O grupo está operando sob coordenação da Universidade La Sapienza, de Roma, que mantém cooperação científica com instituições locais e representantes das ordens religiosas responsáveis pelo santuário. A decisão de retomar os trabalhos após o período pascal já está em andamento, e a previsão é que novas etapas de escavação se estendam pelos próximos meses.
Entre os objetivos das próximas fases está a criação de uma reconstrução multimídia do local escavado. O projeto prevê a integração de dados arqueológicos, históricos e visuais em um modelo digital tridimensional que poderá ser acessado por pesquisadores e visitantes. O desenvolvimento dessa interface permitirá que o material seja interpretado dentro de uma perspectiva que une ciência e religião, respeitando os limites de comprovação empírica.
Embora a comunidade arqueológica reconheça que a identificação definitiva de um túmulo como pertencente a uma figura histórica como Jesus de Nazaré seja tecnicamente inviável, o trabalho conduzido em Jerusalém foca na reconstrução do contexto social, religioso e agrícola da época. Esse enfoque permite compreender de forma mais ampla o uso do espaço sagrado ao longo dos séculos e a preservação da memória coletiva em torno do local.
A preservação da área ao longo dos séculos é atribuída principalmente à devoção popular e à administração contínua das três vertentes religiosas que compartilham a custódia da Igreja do Santo Sepulcro. A manutenção do edículo, bem como das estruturas litúrgicas internas e externas, tem sido conduzida mesmo em períodos de conflito ou instabilidade geopolítica, refletindo o valor simbólico e cultural do espaço.
As novas descobertas também despertam o interesse de estudiosos da arqueologia bíblica, um campo interdisciplinar que busca analisar evidências físicas relacionadas a narrativas do Novo e do Antigo Testamento. Nesse contexto, o local assume uma dupla importância: como objeto de estudo empírico e como espaço de experiência religiosa viva. A equipe de pesquisa tem enfatizado que o foco do trabalho não é comprovar doutrinas, mas documentar e interpretar os dados disponíveis com rigor técnico.
O interesse internacional pela descoberta gerou debates entre grupos acadêmicos e representantes religiosos. A publicação dos resultados iniciais em veículos como o The Mirror, além de repercussões em mídias locais no Brasil, indica que a investigação transcende barreiras nacionais e envolve questões relacionadas à identidade cultural, memória histórica e turismo religioso.
O avanço das escavações pode permitir novas descobertas que ampliem o entendimento sobre o contexto urbano, agrícola e funerário da Jerusalém do século I. A análise de solo, restos orgânicos e materiais cerâmicos poderá revelar hábitos cotidianos, sistemas de cultivo, rotas de peregrinação e práticas funerárias de diferentes épocas.
A digitalização do local é considerada um passo estratégico para conciliar a preservação física com o acesso remoto a informações detalhadas. Projetos semelhantes já foram implementados em outros sítios arqueológicos com grande fluxo de turistas, e há expectativa de que o modelo aplicado na Igreja do Santo Sepulcro possa servir de referência para outras regiões com relevância histórica e religiosa.
Por fim, a equipe afirma que o verdadeiro valor da descoberta não está apenas na possibilidade de autenticar um túmulo específico, mas em compreender como a fé moldou e conservou a história daquele espaço ao longo de quase dois mil anos. O projeto permanece em andamento, com novas atualizações previstas para os próximos ciclos de escavação.
fonte: iG, Dol, Correiodopovopenedo.